Evento de Gilmar Mendes em Lisboa reúne lobistas, ministros, juízes, empresários e conflitos de interesse
Ministro do STF reúne 150 autoridades em evento regado a diárias, jantares e passagens pagas com dinheiro público
02/07/2025 09:45
Enquanto o país enfrenta corte de verbas e protestos contra a alta nos preços, pelo menos 150 autoridades brasileiras desembarcam em Lisboa para o 13º Fórum de Lisboa—o famigerado “Gilmarpalooza”, capitaneado pelo ministro do STF Gilmar Mendes. Apesar da organização negar qualquer patrocínio institucional aos convidados, documentos e notas oficiais revelam que passagens, diárias e até jantares de gala serão pagos, direta ou indiretamente, pelos cofres públicos.
Exército de representantes e mistério nos gastos
O evento, que acontece de 2 a 4 de julho, reúne cerca de 400 palestrantes e 2.500 inscritos. Entre eles, destacam-se:
• Cinco ministros do STF (Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Flávio Dino e Luís Roberto Barroso).
• Dezoito ministros do STJ e cinco do TCU.
• Mais de 45 integrantes do governo federal (secretários, assessores e diretores de agências).
• Dezenas de parlamentares, incluindo o presidente da Câmara, Hugo Motta, e seu antecessor, Arthur Lira.
• Governadores e seus secretários.
Apesar de a organização do Fórum afirmar que “não custeará gastos de convidados”, a AGU assegura que passagens e diárias de Mendonça serão bancadas pelo evento; a Polícia Federal diz que arcará com transporte e hospedagem de seu diretor-geral via “organização”; e o Senado confirma voo de R$ 32 mil para a senadora Daniella Ribeiro (PP-PB). A Aneel, sem entrar em detalhes, afirma que “custos de deslocamento” de seu diretor-geral, Sandoval de Araújo Feitosa Neto, serão pagos pelos idealizadores do encontro.
Conflito de interesses e proximidade com empresários
O ambiente “acadêmico” combina um conluio escancarado entre magistrados e setores privados:
• Gilmar Mendes é sócio-fundador do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), um dos promotores do evento, onde seu filho Francisco Mendes exerce cargo de direção.
• Patrocinadores paralelos, como FGV e Universidade de Lisboa, oferecem palcos e jantares aos mesmos nomes que poderão julgar processos dessas instituições no STF.
• Eventos à parte organizados por BTG Pactual e Esfera Brasil reúnem banqueiros e industriais, enquanto debates oficiais pregam combate à corrupção.
No evento realizado em 2023, estava presente o então presidente da Câmara Arthur Lira enquanto pairava sobre ele uma investigação envolvendo o escândalo de supostos desvios de recursos usados para aquisição de kits de robótica com dinheiro da União. Após o evento, Gilmar foi o relator do habeas corpus de Lira e anulou toda investigação e as provas obtidas. Lira sempre negou qualquer irregularidade bem como qualquer discussão sobre favores em Lisboa.
Luxo e farra em plena crise
Em um país marcado por filas no SUS, cortes de bolsas de pesquisa e agravamento da pobreza, o desembarque de ministros em voos de Estado e a reserva de palacetes para “networking” soa como espetáculo de entretenimento de luxo.
• Alojamentos em hotéis cinco estrelas ou mansões universitárias.
• Ingressos a R$ 800 destinado a “autoridades” eximidas de pagar.
• Jantares privados com flautas de champagne e discursos de “heróis do Brasil”.
Transparência nebulosa
Críticos apontam que a falta de clareza sobre os financiadores do Gilmarpalooza fere a Lei de Acesso à Informação e o princípio da impessoalidade. Defensores do suposto intercâmbio acadêmico afirmam obedecer às normas, mas evitam detalhar contratos e convênios, mantendo o público no escuro.
Reações e desdobramentos
Nas redes sociais, a hashtag #Gilmarpalooza ganhou força como símbolo de denúncia ao que muitos chamam de “judiciário festivo”. Parlamentares de oposição prometem apresentar requerimentos de informação no Congresso e questionar eventuais passagens clandestinas pelo Portal da Transparência.
O Fórum de Lisboa escancara o vaivém entre o Poder Judiciário, a política e o setor privado, erguendo um palco de luxo que custa milhões aos cofres públicos—enquanto o Brasil luta para equipar hospitais e escolas.